XANGÔ
Xangô meu pai poderoso
olha as minhas aflições
que já morri muitas vezes
muitas vezes renasci,
e com teu axé formoso
milhões de lutas venci.
Já rastejei feito cobra
entre as garras do leão.
Já andei na corda bamba,
já passei de maão em mão.
Atropelei o meu samba
e no final da manobra
eu dei de cara no chão.
Tem dois lados o machado
dois olhos tem o falcão.
Mas o traço do riscado
é que marca a posição.
Capitão vira soldado
e vassalo vira rei.
É pra ver que o destronado
assim trocando de lado
percebe a força da lei.
Xangô envia teu raio
de justiça reluzente,
acerta logo no alvo
bota a verdade de frente.
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OXALÁ
Lavei minh´alma na fonte
das águas de Oxalá
e o inferno de Caronte
esse ficou por lá.
Lavei com ervas de cheiro
pra benzer meu orixá
e no ponto do terreiro
o futuro que virá.
lavei as mãos com arruda
os cabelos com alecrim
e o carrego que afunda
ficou bem longe de mim.
Oxaguian é beleza
corajoso, homem forte,
mestre da natureza,
portador de boa sorte.
Oxalufan é idoso,
sábio rei coroado,
de cerne generoso
lá no Bonfim adorado.
O divino não tem forma
e o bem não tem idade;
existe só uma norma
a própria felicidade.
OXUNMARÉ
Olódùmaré tem problema de vista:
nuvem difusa pista irregular.
Que vale um deus que não pode ver?
Um pai ausente, um rei vidente
sem coroa nem lar?
Olódùmaré chama Oxunmaré:
meu bom amigo venha me curar.
Oxunmaré chega bem contente:
Aô Moboi! Aô Moboi! Aô Moboi!
Não chora porque não dói.
Que todo mal tem um lado fraco
que o lado forte pode derrotar.
O debaixo agora vai pra cima
e o de cima volta pro lugar.
Felicidade Olódùmaré sorri.
Só o amor faz tudo mudar.
Oxunmaré vai morar no céu,
que são os olhos do poder do mar.
Espelha as águas em feixes de luz
e o arco-íris a irradiar.
NANÃ
Os tambores falam
que antes de você e eu,
entre neblinas cambiantes
morava uma deusa orante
rainha do pantanal.
Seu vulto é o que se vê
e o rasto que se perde
na caverna natural.
E nessas águas profundas
mergulho meu padecer
à procura de Nanã
Nanã Nanã Burokê.
]Ela me olha de frente
e depois vira de lado.
Não posso crer que o menino
embaralhou o critério,.
Sim existe amor eterno
Mas toda arte tem mistério.
Tem pena, velha tem pena,
desse coração perdido,
que um dia foi amado,
mas anda desnorteado,
e o pio mocho condena.
Tem pena, velha, tem pena:
me benze com o teu cajado...
TUTU MORINGA
Vê aquele negro triste
que chora à mesa do bar?
Ele perdeu seus meninos
e disso não quer falar.
Vendido à meia-pataca
num estrado junto ao cais,
levou sinete de marca
que não se apaga jamais.
Trocado num orfanato,
quando um dia ele sumiu,
foi por causa do contrato
que o patrão exigiu.
Levado numa corrente
de cordão de carnaval,
que arrasta muita gente
que se acredita imortal.
Caçado na noite fria
pela tropa regular;
disso ele não sabia
nem podia imaginar.
Queimado frito num ninho
por um sonho de revés,
que enrolou de espinho
o ouro feito nos pés.
Olhos d´água negro pinga
Lamenta tutu-moringa
remoendo a solidão.
Gente humilde não se vinga
porque tem bom coração.
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